Foto de Carlos Pereira
ENCONTRO COM ALBERTO CAEIRO
Carlos Pereira
Havia um silêncio suspenso, tão
profundo,
que se ouvia com uma nitidez
transparente
o ranger das paredes, soltando as
suas dores
em forma de música gregoriana.
A luz do sol, através de um
estore a necessitar de conserto,
incidia sobre a mesa iluminando a
folha
em que escrevera o título: «A
solidão às vezes»;
para um possível poema.
Eu era o único cliente naquele
café de paredes austeras
de granito de muitos séculos com
histórias e segredos,
que tentava decifrar através de
imagens que perpassavam
diante dos meus olhos como num
filme dos anos trinta.
Absorto no meu estado de
letargia, os meus sentidos,
auditivo e visão, não me deram
conta da chegada de uma figura
de aspecto seráfico, misterioso,
de olhar contemplativo.
Posso sentar-me, perguntou, ao
mesmo tempo que os seus olhos
se fixavam na folha de papel
iluminada pelo sol cálido da tarde.
Peço mil desculpas pela
interrupção, disse com convicção
e humildade, apresentando-se como
alguém que escrevia versos.
Não tem de quê, retorqui em tom
tranquilizador: o meu inócuo poema
pode ser adiado por uma conversa
reflexiva e libertadora.
Aveiro,
28.02.2014
Publicado
no Diário de Aveiro
Gostei deste encontro com Alberto Caeiro, que o levou a escrever este belo poema.
ResponderExcluirAbraço.